No artigo anterior descrevemos o percurso nacional a caminho do Uruguai a bordo do Ford Del Rey e havíamos chegado até o extremo Sul do Brasil, na cidade do Chuí. Agora, convido a todos para embarcarem com a gente na etapa internacional desta viagem, adentrando neste interessante país repleto de carros antigos.
Como de costume, antes de sair do hotel demos uma checada nos itens básicos do Del Rey e constatamos, mais uma vez, um consumo alto de óleo de motor e utilizamos parte de nosso segundo litro, dos três que levávamos de reserva. No dia anterior, durante a viagem, começamos a notar também que ao reduzir as marchas, uma fumaça densa saía pelo escapamento, evidenciando algo de errado. Ainda assim, completamos o nível e seguimos em frente.
Era a hora de entrar oficialmente no Uruguai. Assim, paramos na Aduana para preencher os papéis de migração e nos pediram toda a documentação minha, do Rapha e a do Del Rey, que deveria estar registrado em nome de um dos ocupantes (muitos anos antes, não conseguimos entrar na Argentina com este mesmo carro por este motivo). Neste momento, também nos solicitaram um documento chamado “carta verde”, que nada mais é do que um seguro obrigatório para veículos estrangeiros que viajam por países do Mercosul. Felizmente sabíamos destas exigências e não tivemos problemas. Neste momento, também, revistaram nosso carro e a mala de ferramentas que sempre levamos no Del Rey, pois levantou alguma suspeita do fiscal, mas que ao avaliar o conteúdo e constatar que o objetivo dela era apenas garantir nossa segurança na viagem, nos liberou sem problemas.
Navegando à moda antiga, sem GPS
Tomamos a Ruta 9 a caminho de nosso destino do dia, Punta del Este, e aí realmente nos sentimos no Uruguai, um país surreal para quem admira carros antigos. Diferentemente do Brasil, onde os carros antigos, em sua maioria, são cultuados como raridades e geralmente ficam guardados em prateleiras para serem exibidos em eventos, no Uruguai eles são utilizados no dia a dia. Conceito que por sinal concordamos, afinal automóveis foram construídos para serem desfrutados.
Chegamos a ver carros como Borgward Izabela, Hudson Vasp, Saab e uma infinidade de pick-ups dos anos 1940/50 circulando calmamente por regiões locais.
Bienvenido Punta del Este
A Ruta 9 é uma grande reta, habitat ideal para um carro confortável como o Del Rey. A pista é de mão dupla, mas o escasso trânsito torna a viagem tranqüila e agradável.
Casapueblo ao fundo
(Casapueblo é a antiga casa de verão do artista uruguaio Carlos Páez Vilaró e é agora uma cidadela-escultura, que inclui um museu, uma galeria de arte e um hotel chamado Hotel Casapueblo, que fica dentro da estrutura. Ele está localizado em Punta Ballena, próximo de Punta del Este, Uruguai. Construído ao redor de uma caixa de lata chamada La Pionera (Da Pioneer), foi o arquiteto Carlos Páez Vilaró que definiu seu estilo que pode igualar às casas da costa mediterrânica de Santorini, mas geralmente o arquiteto refere andaluzia Forneiro, um pássaro típico do Uruguai, para discutir o tipo de construção. No interior há um museu e uma galeria de arte, mas há alguns anos ele construiu um apart-hotel chamado Hotel Casapueblo ou Club Hotel Casapueblo e tem um restaurante chamado Las Terrazas (As Terrazas), que segue o estilo da construção original e oferece um saboroso menu internacional)
Quando chegamos a Punta del Este esta simplicidade do Uruguai muda bastante e os veículos são bem mais novos e caros, já que o poder aquisitivo deste badalado balneário uruguaio é bem elevado. Em uma das vezes que olhei pelo retrovisor avistei nada menos que um Aston Martin novinho em folha, orgulhosamente conduzido por um senhor de cabelos grisalhos, acompanhado de um belo exemplar do sexo oposto.
Escultura La Mano
(O monumento “La Mano”, obra do chileno Mario Irarrazabal os dedos saindo da areia, ou “a presença do homem surgindo na natureza”, na visão do artista)
Tudo em Punta del Este é cotado em dólares, mas como fomos em época de baixa temporada, conseguimos encontrar um bom hotel por “módicos” US$ 45,00 a diária. Em época de alta temporada este preço dobra.
Hotel Cassino Conrad
Depois de três dias muito agradáveis (mas bem frios) de repouso e exploração de boa parte do litoral da região, que vai muito além de Punta del Este, partimos para a capital Montevidéu. O caminho todo até a capital é repleto de desmanches de carros antigos, chamados pelos uruguaios de “desarmaderos”, o que é uma atração à parte para quem é da turma da ferrugem como eu e meu filho.
Desarmaderos, desmanches de carros antigos
Tomamos novamente a grande reta que nos levava até o Brasil e seguimos o caminho de casa sem sermos parados uma única vez por policiais em todo o trajeto de 4.418 Km percorridos impecavelmente pelo velho Del Rey, com exceção do alto consumo de óleo, que mais tarde descobrimos ser causado por uma montagem imprecisa dos anéis de segmento, o que exigiu uma nova abertura do motor que, para os malucos de plantão é claro, significou um pouco mais de divertimento. Detalhe que hoje nunca deixamos de evidenciar em nossos cursos na Escola de Restauração de Automóveis Antigos: ao mesmo tempo que defendemos que um carro antigo pode ser tão confiável quanto um carro novo, quando bem mantido e preparado para o desafio, obviamente condizente com o seu projeto.
No caminho de volta para casa, o assunto entre pai e filho era um só: o que melhorar no Del Rey para a próxima viagem, quem sabe um pouquinho mais longa, e que certamente será compartilhada com os leitores.
Até a próxima…
*Wagner Coronado é Tecnólogo de Soldagem e consultor de empresas da área automobiliística na Synergic Consultoria e Treinamento. Professor da Escola de Restauração de Veículos Antigos (www.escoladerestauracao.com.br), Coronado ensina a construir carros novos, mas é pelos velhinhos que seu coração bate mais forte. Gosta de viajar com eles e escrever sobre suas histórias
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